26.8.16

While You Were Gone (1/5)

Título: Enquanto Você Estava Fora
Autora: sarcastic_fina
Resumo: Com Clark e Lois longe, Chloe é deixada à própria sorte, mas há outra pessoa disposta a ajudá-la a recolher os pedaços, e no processo, ele também se cura.
Classificação: NC-17





Ele entrou pela janela como um ladrão comum. Ele sabia onde a chave estava, poderia ter entrado pela porta como uma pessoa normal, mas enfim... Nenhum dos dois era realmente tão normal. Ela estava deitada ali e acordada há horas, virando de um lado para o outro e encarando o teto, desejando que ele caísse sobre sua cabeça e a tirasse daquela miséria. Todos tinham ido embora e agora ela estava abandonada ao silêncio, algo que nunca conseguiu encarar muito bem. 

Ele não falava e ela não queria que ele falasse. Em vez disso, ele se sentava na beira da cama, a cabeça inclinada e os braços caídos no colo. Pesar, raiva e confusão o engoliam. Ela conhecia bem esses sentimentos, mas como não sabia o que fazer com sua própria gama exaustiva de emoções, ela simplesmente esperava.

Finalmente, quando pareceu que nenhum dos dois podia mais suportar o suspense, ele se deitou e se enroscou ao lado dela, de costas. Ela permaneceu em silêncio e se virou para a parede oposta. Inspirando profundamente, sentindo o cheiro pesado de couro e suor, ela deixou os olhos se fecharem e agradeceu o sono, antes perdido.

E assim foi durante semanas. Ele aparecia, normalmente por volta das três ou quatro da manhã, sem dizer nada, sentava-se em silenciosa contemplação e então se deitava. Eles não se tocavam, não falavam, e ele nunca olhava pra ela. Parte dela sentia que ele estava se desculpando de algum modo. Mas ao mesmo tempo, ela sentia como se ele também estivesse procurando conforto.

Ela se percebeu nervosa algumas manhãs, acordando e descobrindo que ele havia ido embora e ficava brava por ele achar que podia ir até ela, se deitar na mesma cama em que Jimmy se deitara. Ela dizia a si mesma que quando ele viesse aquela noite, o pediria para parar. Diria que eles não podiam fazer aquilo, o que quer que fosse. Mas quando ele chegava e a mesma rotina acontecia, ela permanecia em silêncio, não mais chateada, mas necessitada do calor e do peso ao seu lado.

Nas primeiras semanas, ela disse a si mesma que ele era Jimmy. Ela se acalmou fingindo que ele não havia morrido, que ele estava bem ali ao lado dela. Que nunca existiu um Davis Bloome para entrar e destruir a vida que ela construíra. Mas então ela respirava fundo e o cheiro de sândalo, ar fresco e suor invadiam seus sentidos, relembrando-a de que o homem deitado ao seu lado não era nada parecido com Jimmy. E embora doesse, saber que a bolha havia estourado, também servia como cura. Não havia chance para qualquer tipo de negação e depois de um tempo, ela simplesmente parou e aceitou que ele tinha ido embora, mas isso não significava que ela estivesse sozinha.

A primeira vez que ele falou, ela se encontrou menos surpresa do que esperava.

"Eu peguei um ladrão ontem... Não teve sorte em espreitar um caixa eletrônico, então ele resolveu tentar uma loja de penhores..." Ele balançou a cabeça, um sorriso amargo nos lábios. "Ele implorou que eu o soltasse, disse que só estava tentando sobreviver..."

Ela esperou, olhou, observou a rápida mudança de emoções no rosto iluminado pelas luzes da rua.

"E eu o soltei", ele finalmente disse, a voz baixa, rouca. "Ele teria assustado, possivelmente até ferido as pessoas que chegassem ao caixa eletrônico. Ele teria saqueado o negócio de alguém, pegando o que quisesse e vendendo a quem pagasse mais. E ele vai fazer isso de novo, eu sei. Mas... eu o deixei ir desta vez." Ele suspirou, a cabeça ainda mais baixa para esfregar os olhos em frustração.

Ela não precisou perguntar porque, pois ele já estava buscando a explicação.

"Eu olhei pra ele e tudo que consegui ver foi um ser humano patético... E talvez ele estivesse apenas tentando sobreviver ou talvez... Talvez ele goste da sensação. Eu não sei... Mas eu sei que ele parecia uma formiga insignificante comparada às baratas que rapidamente tomam conta de tudo... Os monstros, tanto humanos quanto alienígenas, que farão qualquer coisa, não para sobreviver, mas para conquistar..." Mãos correndo pelo cabelo antes de descerem para esfregar a nuca, tirando o distorcedor de voz e jogando-o  no chão sem nenhum cuidado.

"O que eu estou fazendo?" ele perguntou, fechando os olhos com força.

Ela não tinha certeza de porque o fizera; palavras teriam o mesmo efeito. Mas em vez disso, ela ficou de joelhos e estendeu a mão para ele. Ela passou os braços pelos ombros dele, desceu o zíper do colete e o puxou do corpo dele, deixando-o cair no chão. E então ela o abraçou, sua bochecha pressionada contra o ombro dele e os braços o envolveram, mão pressionada contra o peito dele; as batidas do coração dele sentidos em sua palma.

"Sobrevivendo", ela murmurou gentilmente.

Ele subiu a mão, cobrindo a dela, e os dois ficaram ali, simplesmente respirando em silêncio.

Depois de um tempo, ela sentiu os olhos ficarem pesados e sem pensar, o puxou até que ele estivesse deitado ao lado dela. Mas desta vez, ela não se virou e nem ele. Ele se deitou de costas, ainda segurando a mão dela e juntos, eles adormeceram.

A rotina então mudou, ele chegava e se deitava, mas se precisasse, ele conversava e compartilhava e lentamente ela sentiu que ele estava se curando. Ela se lembrava muito bem do herói caído que ele parecia, mas agora estava se tornando o homem que uma vez ela admirara por seu forte senso de lealdade e justiça.

Contos de tristeza, de erros e arrependimentos estavam sendo substituídos pelos de triunfo, da alegria em saber que havia feito a coisa certa e salvo alguém. Ele ainda não olhava pra ela, mas quando falava, suas palavras eram apenas para ela. Ele não parecia mais derrotado ou em sofrimento, ele estava se abrindo sobre os bandidos e os mocinhos e as razões para fazer o que fazia. Ele contou sobre Tess, toda a história sórdida, ele explicou tudo com Lois e como o amor que ele tinha certeza sentir pelos dois não era o que parecia. E em algumas noites, quando o quarto parecia mais escuro, ele confidenciava lembranças de seus pais. Ele segurava a mão dela com força nessas vezes, e ela corria o polegar contra a dele, tentando confortá-lo enquanto a boca dele parecia ter vida própria, a mente presa no passado.

As noites em que ele não falava, ela sabia que eram sua vez. E ela as deixou passar nas primeiras vezes, abraçando o sono em vez do alívio. Mas então, uma noite, enquanto ele estava apenas deitado ali, desenhando oitos em sua palma, ela falou.

"Eu o amava... Ainda o amo. Mas algumas vezes, eu me pergunto como seria se eu nunca o tivesse conhecido. Nenhum dos dois... Eu me pergunto como teria sido minha vida. Haveria menos drama, mas eu seria mais feliz?" Seus olhos encaravam a noite, como se procurassem por uma resposta que não encontraria.

"E algumas vezes... Algumas vezes eu..." Ela engasgou com um soluço. "Algumas vezes eu fico feliz que ele tenha ido embora... Porque eu penso que só o machucaria mais no fim..." Ela balançou a cabeça, olhos se fechando e apertando as lágrimas numa tentativa de controlar suas emoções. "Eu acho... " Ela inspirou tremulamente. "Eu sei que por mais que nos amássemos... Nunca teria dado certo." Ela cerrou os dentes para segurar o soluço antes que escapasse. "Eu escondi muita coisa dele e estava disposta a continuar fazendo isso. Mesmo quando ele disse que sabia sobre Clark, o resto de mim sabia que era só uma pequena, minúscula parte da montanha de segredos que eu sabia..."

Ela fungou, cerrando a mão no cobertor para se impedir de enxugar o rosto, como se ele já mão tivesse percebido que ela estava chorando. "E eu não contaria a ele o resto. Eu não colocaria você e os outros em risco... Então eu o deixei seguir a vida comigo, onde ele mal sabia metade do que eu fiz ou porque fiz. Como se pudesse mantê-lo seguro de alguma maneira... Ou talvez eu tenha sido egoísta, não sei... Eu só sei que o que quer que tenha acontecido, eu não podia, não iria contar o que ele tão desesperadamente precisava que eu fizesse."

Ela desistiu então, levantou uma mão e enxugou furiosamente o rosto, segurando a testa para parar a dor de cabeça que se formava ali. "E eu faria tudo de novo... Mesmo sabendo o que aconteceu..." A cabeça dela virou de um lado para o outro. "Eu o perdi, e também a Lois e Clark... Mas..." Seus lábios tremeram. "Estou começando a achar que é meu destino ficar sozinha, porque todo mundo ao meu redor é ferido ou morto... ou me abandona."

Cansada de tentar segurar o choro, a barragem se rompeu e ela soluçou inconsolavelmente, esquecendo qualquer tentativa de elegância e deixando o corpo tremer dolorosamente com as lágrimas.

E ele a envolveu, puxando-a pra ele e a abraçando. O rosto dela enterrado em seu peito, lágrimas provavelmente caindo sobre ele. Ele acariciou o cabelo dela e seu calor a acalmou. Podem ter sido minutos ou horas, mas eventualmente, ela deixou os olhos se fecharem e se concentrou em respirar, ouvindo apenas a batidas do coração dele.  

Quando ela acordou naquela manhã, ele não tinha partido como sempre. Ele também não estava dormindo, o que a surpreendeu um pouco. E ele olhou pra ela, pelo que pareceu ser a primeira vez em décadas.

"Café?" Ele perguntou, erguendo uma sobrancelha.

Ela assentiu muda.

"Duas medidas de açúcar, creme", ele relembrou, sem se preocupar em olhar para trás e ver se estava certo.

"Três colheres de açúcar, sem creme", ela murmurou, também conhecendo a preferência dele

Quando ele voltou, ela olhou para a calça de couro verde que ele ainda estava usando. Ele começara a remover o colete e o distorcedor antes de se juntar a ela ultimamente.

Enquanto entregava um copo a ela, ela projetou o queixo. "Isso não deve ser confortável."

Ele olhou para a calça e deu de ombros. "Você se acostuma."

Ela bufou antes de tomar um longo gole do café. "Por alguma razão, eu duvido."

Um sorriso surgiu na boca dele. "Então você vai recusar couro em seu uniforme?"

Surpresa, ela olhou pra cima. "Eu ainda estou no time?"

Ele pareceu entristecer. "Todos nós cometemos erros... Não podemos perder aliados, especialmente os que são tão leais quanto você."

Ela olhou para baixo, encarando o cobertor pensativamente. "Couro não é muito fresco", finalmente disse e sentiu o alívio a invadir.

"E eu aqui pensando que um uniforme vermelho era sua cara", ele brincou.

Balançando a cabeça, ela se recostou contra a cabeceira. "Obviamente você precisa colocar o sono em dia."

Rindo, ele se sentou na beira da cama, não mais a figura taciturna de antes. "Na verdade, ultimamente, tenho dormido melhor que nunca."

"Certo, vamos chamar de insanidade então."

Ele assentiu com um leve dar de ombros. "Não é a primeira acusação de insanidade que escuto."

"Repetição é um sinal."

"Verdade." Correndo uma mão pelo cabelo bagunçado, ele olhou para ela por sobre o ombro. "Acha que é melhor eu me internar em Belle Reve?"

"Isso só significaria que eu teria que elaborar um plano complexo pra tirá-lo de lá. Por favor, poupe-me do trabalho", ela respondeu, percebendo sua boca se curvar. Ela não sentia essa facilidade há muito tempo. 

"Sem o traje, você não tem um disfarce", ele a relembrou.

Ela ergueu uma sobrancelha, descansando o copo no colo. "E desde quando a roupa preta para invadir lugares saiu de moda?"

Ele revirou os olhos. "Nenhum herói de respeito desceria a tanto."

Balançando a cabeça, ela sorriu convencida. "Eu sou a sidekick, lembra? Posso usar o que eu quiser."

"Infelizmente pra você, este time tem uma regra que exige uniformes", ele respondeu com a mesma esperteza.

Ela abriu a boca e uma risada a escapou. "Bart usa um capuz e calça jeans!"

"Isso foi o máximo que consegui convertê-lo", ele respondeu com um dar de ombros. "E você deve ter percebido que nenhum dos dois é preto."

Ela franziu a testa comicamente. "Então o que, eu mudo a cor da minha roupa retrô de assaltante e fica tudo bem?"

"Não, ainda é uma desculpa esfarrapada." Recostando-se, ele sorriu. "Qual sua opinião sobre o nylon?"

Com uma risada de diversão, ela jogou um travesseiro contra a cabeça dele em resposta.

Pegando-o com facilidade, ele o colocou ao seu lado e se apoiou confortavelmente. "Tudo bem, vamos pensar numa roupa, mas falando sério, eu gostaria de ter você de volta como Watchtower, fazendo o que faz de melhor..."

Sorriso desaparecendo, ela mordeu o lábio. Não podia se lembrar de ter saído do apartamento pra nada mais do que para comprar comida e o jornal.

"Não tem pressa, mas... Eu queria que você soubesse que ainda é bem-vinda... Que você sempre será." Ele olhou pra ela com expectativa, olhos castanhos sinceros e carinhosos.

Assentindo, ela voltou o olhar para o café. "Vou dar uma olhada na minha agenda e te dou uma resposta", ela disse.

"Ótimo." Descendo da cama, ele pegou o distorcedor e o colete. "Se eu sair agora, as pessoas vão pensar que sou um esquisito com fetiche pelo Halloween?"

Revirando os olhos, ela apontou para um armário atrás dele. "Acho que tenho algumas roupas ali que servem em você. Você é muito grande para alguma coisa do Jimmy, mas depois de algumas noites de luta com Clark, ocasionalmente resultando nele acampando em meu sofá, algumas coisas ficaram pra trás."

Assentindo, ele vasculhou o armário até encontrar uma calça moletom e um suéter. "Está bom para eu voltar?" ele perguntou, mostrando as peças.

"Não são pretos, mas acho que servem."

Com um aceno de cabeça, ele foi até a porta. "Se precisar de alguma coisa..." ele falou.

"Eu sei."

Ele mandou um sorriso na direção dela antes de ir se trocar no banheiro e usar a porta da frente para sair.

Pela primeira vez em algumas semanas, ela sentia-se pronta para enfrentar o mundo.

Ele não parou de visitá-la.

Exceto que agora, viesse a conversa de um lado ou do outro, eles acabavam deitados juntos. A cabeça dela no peito dele e a mão dele acariciando o cabelo dela, distraidamente. E antes que ela adormecesse, ela o sentia beijar sua testa ternamente. Ele deixou de desaparecer antes de ela acordar e um dia ela encontrou uma mochila no chão, e assim ele tinha uma roupa para se trocar de manhã. Ele nunca desfazia a mala, mas ela estava sempre ali, pronta para qualquer evento.

Ele ficou no quarto com ela dando apoio moral quando ela decidiu que era hora de embalar todas as coisas de Jimmy. Ele a abraçou quando ela chorou ao saber que a polícia anunciou a suspensão das buscas por Lois. Ele a apoiou quando ela cedeu os direitos da ISIS a outra pessoa que daria a fundação o cuidado e atenção que ela precisava. E toda noite, ele a abraçava e a ouvia e nunca a deixava mergulhar na solidão que sempre estava a espreita.

Ela não sabia como agradecê-lo, mas então, ela tinha certeza de que na verdade um estava apoiando o outro. Quando ele desabava, ela o trazia de volta, quando ele precisava falar, ela ouvia, quando ele se questionava, ela estava ali para lhe dar alguma razão. E o peso da vida mudou, agora equilibrado confortavelmente entre os dois, em vez de estar sobre a cabeça de um dos dois. Ela sentia-se renovada e apreciada e eventualmente, ela sentiu como se o mundo não estivesse mais tentando esmagá-la.

______
DOIS

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4 comentários:

  1. Tão bonitinho o Oliver cuidando da Chloe, adoro esta autora ela tem uns textos bem intensos , obrigado Sofia por manter o amor chlollie vivo.
    :)

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  2. Ah, Sofia, você voltou!!! \o/

    E já tenho certeza que vou amar mais esta fic... adoro fics que abordam o início de tudo, elas sempre rendem... ;D

    GIL

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    Respostas
    1. Oi, GIL, pois é, tinha esse capítulo traduzido e resolvi postar, agora vou correr para traduzir os próximos... dedos cruzados...

      Também amo essas histórias que mostram esse momento de tristeza da Chloe e o começo de sua cura... ;-)

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